Pós-graduanda (o), você sabia que estão tentando cobrar mensalidades dos estudantes nas universidades públicas? Semana passada (24/05), o deputado bolsonarista, General Paternelli, junto ao representante do MBL, Kim Kataguiri, e o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, Arthur Maia, incluíram na pauta da reunião extraordinária da Comissão de Constituição e Justiça, a votação da proposta de emenda constitucional (PEC) 206/2019 que objetiva a cobrança de mensalidades nas universidades públicas brasileiras. Ainda, na última semana (27/05), o governo de Bolsonaro cortou R$3,23 bilhões que seriam destinados ao Ministério da Educação (MEC), que equivalem a 15% do orçamento da educação.
A universidade pública é respaldada pelo princípio de gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais (Art. 206 da Constituição Federal) é uma conquista do movimento estudantil brasileiro e demais categorias organizadas nos meados do século passado. Por isso, questionamos alguns argumentos falaciosos que deslegitimam a luta do movimento estudantil a partir das propostas de cobrança. Apresentamos também questões específicas da pós-graduação, afim de provocar uma reflexão sobre pontos apresentado desde o ano passado, ao criticar as Resoluções que alteravam profundamente o caráter da pós-graduação na UFSC, tal como a Resolução 015, que chegou até o Conselho Universitário (CUn) pautando questões problemáticas, como por exemplo a institucionalização da cobrança de mensalidade em cursos de especialização lato sensu.
Diminuir desigualdades sociais, cobrar estudantes da elite para pagar… sobre qual realidade estão falando?
Grande parte de nós, estudantes da UFSC, sentimos cotidianamente na pele a situação de ausência de recursos que assolam a universidade por quase uma década. Basta caminhar pelo Centro de Física e Matemática (CFM), ou outros centros, como o Centro de Filosofia e Humanidades (CFH), e são percebidos os problemas gravíssimos na infraestrutura, como goteiras, problemas na fiação, tetos desabando e até espaços pegando fogo. Além da própria estrutura sucateada, com poucos laboratórios funcionando com equipamentos adequados, falta de espaços de convivência e de ferramentas de pesquisa (como por exemplo falta de computadores e títulos atualizados na biblioteca), há problemas também na maioria dos departamentos, que se encontram com o quadro insuficiente de docentes e sequer tem previsão para contratação, algo que resulta na sobrecarga dos trabalhadores e impacta diretamente na qualidade do ensino.
Como se não bastasse o cenário de precarização da estrutura universitária na realização das atividades acadêmicas, as condições de vida duras tornam a vida de grande parcela estudantil um desafio de malabarismo, com contas caras para pagar e pouco dinheiro. São poucas as e os estudantes de pós que contam atualmente com uma bolsa insuficiente, que não foi reajustada para enfrentar a inflação crescente que vivemos no Brasil, e muitas pessoas sequer têm bolsa.
A narrativa construída por aqueles que defendem a cobrança de mensalidade tem dois eixos principais: que os custos da universidade oneram as finanças do Estado; e que o Estado estaria “privilegiando” estudantes com renda familiar suficiente para bancar os possíveis custos com mensalidades. Mas, nós estudantes, que vivemos na pele a deterioração das condições de vida e as precarizações da universidade, sabemos que esse não é o perfil discente que representa a universidade. Dados do Perfil Socioeconômico dos Estudantes das Universidades Federais, apontam que 70,2% dos graduandos de universidades públicas vêm de famílias com renda per capita de até um salário mínimo e meio. Sabemos que a PEC 206/2019 não surge para contribuir com o financiamento da universidade pública, pelo contrário: há anos são feitos investimentos estatais e benefícios para instituições de ensino superior privada, enquanto se adensa a crise orçamentária na educação pública brasileira, com estrangulamento dos orçamentos antes mesmo da Emenda Constitucional 95/2016, que estabeleceu o congelamento dos gastos por 20 anos e avançou na contramão das necessidades da comunidade acadêmica.
Aqueles que defendem um projeto de educação superior privada, tanto através da privatização dos serviços, quanto na cobrança das mensalidades, atacam diretamente o direito e a possibilidade da população pobre de acessar a universidade pública.
Devemos combater qualquer proposição que ameace nossa instituição em seu caráter público, gratuito, autônomo e de qualidade! Por isso, estar atentas (os) também as mais sutis brechas que ameçam esses princípios caros para nós é nosso dever, como foi a posição da entidade no ano passado (adicionar data) quando chegou no Conselho Universitário a possibilidade de institucionalização da cobrança de mensalidade em cursos de especialização.
A luta da APG sobre as mudanças em resoluções da pós-graduação
Durante o ano passado, a entidade chamou a atenção para uma das resoluções que traria uma mudança grande para a pós-graduação: a Resolução Normativa N.º 15/CUn/2011 (Número do processo para consulta no SPA/UFSC: 23080.018994/2019-91), a qual propunha alterações na pós-graduação lato sensu.
Uma das alterações mais gritantes era a institucionalização de cobranças de mensalidade para pós-graduação lato sensu. Em alguns cursos de especialização essa cobrança já acontece, porém essa brecha para cobranças na universidade serve para que assimilemos cada vez mais a lógica privada dentro da universidade, e que aceitemos sua expansão para o restante da pós-graduação e da universidade como um todo. A resolução 015/2021 não passou no Conselho Universitário, entretanto chegou até essa instância e, por parte de alguns conselheiros, teve apoio. Esse exemplo nos mostra o quanto a própria gestão da universidade é capaz de assimilar a lógica privatista, inserindo cada vez mais recursos privados como se fossem pequenas mudanças para nossa instituição. Até quando poderemos chamar a universidade de pública quando vemos cada vez mais seus espaços pautados pelo capital, por parcerias e convênios, como se fossem estas a única saída para o problema orçamentário que temos enfrentado?
Diante desse cenário, é fundamental que nós, que realizamos pesquisas dentro da universidade pública, discutamos seriamente qual é o projeto de universidade queremos. Não podemos ficar a mercê de mudanças que, a princípio, não passam de forma tão gritante, quanto a PEC 206/2019, mas que conseguem introduzir o mesmo tipo de lógica que mina cada vez mais o sentido público, gratuito e de qualidade em nossa universidade.
A proposta da PEC 206/2019 foi tirada de pauta na CCJ após um acordo entre deputados governistas e da oposição, que aconteceu em 31 de maio. Mas nossa luta não pode esfriar a partir dessa movimentação falaciosa, que serve para demonstrar também que o pacto de conciliação de classes segue a todo vapor na esfera legislativa do estado brasileiro. Sabemos que esses acordos são recursos para ocultar a verdadeira face do problema e nos opomos a qualquer tentativa de retorno da PEC 206/2019 como pauta de deliberação legislativa.
Não a cobrança de mensalidade na universidade pública!
Pela manutenção e reforço de uma universidade pública, gratuita, autônoma e de qualidade!
Seguimos em luta.