CPG se aproveita da pandemia para “passar a boiada” do EAD
Em sessão remota realizada no dia 27 de maio de 2020, a Câmara de Pós-graduação da UFSC aprovou minuta que autoriza a realização de atividades de ensino não presenciais.
O primeiro ponto que podemos destacar é que a aprovação da minuta em questão ignora os debates realizados em outros espaços da Universidade e coloca o termo “ensino remoto” de forma leviana. No subcomitê acadêmico, vinculado ao Comitê de Combate à Covid da UFSC, a partir do debate coletivo realizado em várias reuniões, foi aceita a contribuição do Centro de Ciências da Educação (CED) de conceituar as propostas de atividades remotas não como ensino, mas como “atividades pedagógicas não presenciais”. Isso à primeira vista pode parecer um preciosismo, mas não é! Este ponto se torna fundamental para que neste momento pandêmico, de situação emergencial, seja firmada a interpretação dos educadores e dos educandos envolvidos de que o que iremos realizar, enquanto Universidade, são atividades emergenciais pedagógicas em tempos de pandemia. Assim, não deixamos aberta a porta do oportunismo de transformar o ensino presencial em “ensino remoto”, pois uma modalidade não pode, em contexto nenhum, substituir a outra. São modalidades distintas e com percursos formativos distintos.
Essa foi apenas a terceira reunião em meio à pandemia que debateu o tema e avaliamos que esse prazo não foi suficiente, dada a condição desta pandemia inédita para nossa geração e de que estamos muito distantes do que possa ser considerado “normalidade”. Na verdade, ainda não discutimos nem o que será a tal “nova normalidade”.
Outro problema é que ainda não fomos capazes de realizar um levantamento preciso sobre a situação de todas e todos os sujeitos que constroem a vida acadêmica na universidade, ou seja, os servidores TAEs, os/as estudantes e o corpo docente. Isso impossibilita qualquer decisão que seja de fato e de direito democrática, inclusiva e participativa. Nos perguntamos quais são os interesses por trás da pressa em aprovar tal minuta, sem respeitar o tempo da ciência, das pessoas envolvidas no processo, entender a realidade e propor soluções. A pressa do produtivismo, da volta das atividades, sejam elas econômicas ou pedagógicas, não pode ser um termômetro para a real produção de uma ciência que leve em consideração o ser humano, as questões humanas e a vida. Afinal, são pessoas de carne e osso, com sentimentos, as quais constroem a Universidade, a nossa sociedade, não números, muito menos coisas.
Nossa posição, declarada desde o início da reunião, era pela não–aprovação de nenhuma resolução que não pudesse ser mais e melhor debatida pela comunidade acadêmica e respaldada pela realidade – por meio de um levantamento unificado que investigue os aspectos objetivos e subjetivos de todas e todos os envolvidos no processo de ensino.
Inicialmente, houve a aprovação da solicitação, feita pelo professor Roberto Pacheco, que colocava como prioridade o item 6 da pauta (item referente à questão do ensino) e o colocava em regime de urgência. Nós nos posicionamos contra essa alteração da pauta e solicitamos que fosse realizada uma votação separada para a questão do regime de urgência, pois não havia possibilidade de discutir a minuta proposta para o retorno das atividades (item 6) sem a discussão do parecer sobre o questionário e a relidade dos discentes e docentes da pós-graduação da UFSC. A consequência da aprovação do regime de urgência foi que, ao solicitarmos vistas, o prazo que nos foi dado para fornecer um parecer foi até às 13hs do mesmo dia.
Fomos surpreendidos positivamente pelos argumentos do relator do processo original e muito negativamente pelo aparecimento “repentino” de um parecer paralelo – chamá-lo de substitutivo, da forma atropelada como foi encaminhado, seria injusto – feito por um grupo de professores liderados na reunião pelo professor Orides Mezzaroba (PPGPD), que estavam totalmente indispostos a encarar o debate democrático que seria necessário. Por muitas vezes interromperam a fala da pró-reitora Cristiane tentando conduzir a reunião, por exemplo. Atuaram apoiados em argumentos técnicos – com regimentos e normas de baixo do braço – os quais, por pressupor a norma apartada da realidade, demonstram total insensibilidade ou falta de conhecimentos acerca da vida dos estudantes de pós-graduação.
Os professores chegaram a tentar antecipar a votação para antes de entregarmos nosso parecer, sob o argumento de que “claramente já havia uma maioria formada e seria mera formalidade esperar o parecer da APG pra votar”. Além disso, sinalizaram um total desprezo pelo trabalho dos estudantes envolvidos dizendo que aquele espaço “não era o movimento estudantil” e que deveríamos aceitar a decisão da maioria já estabelecida.
Na prática, menosprezaram também as discussões e debates realizados nos espaços dos subcomitês, sejam eles acadêmico, científico, central, etc, secundarizando o trabalho realizado por colegas das diferentes categorias da Universidade em um árduo trabalho coletivo de debate e discussões. Valeu a “carteirada” do professorado distante da situação real da comunidade acadêmica e da própria sociedade em que vive. Se não for pelo debate transparente, respeitoso, equilibrado e ampliado, como vamos chegar em uma decisão que não abandone ninguém pelo caminho?
Em outro momento, em reunião passada, a opinião dos estudantes foi chamada de “preconceito” contra a Câmara de Pós-Graduação. Este é outro ponto que podemos destacar, pois um debate democrático de fato não pode ter decisões a priori e muito menos desprezar dessa forma a posição dos estudantes, que apesar da pouca representatividade, ainda buscam lutar por melhores condições de estudo e trabalho.
De nossa parte, não éramos favoráveis à tal minuta, mesmo com as inclusões propostas pelo parecerista inicial, que certamente dariam um ar muito mais honesto e baseado em realidade para a minuta. Apesar dessa nossa posição, fizemos nosso parecer de vistas no sentido de dialogar com o parecer inicial (legítimo) o qual elencava algumas condições que também consideramos mínimas e necessárias para podermos almejar a realização de qualquer tipo de atividade remota.
Em sentido oposto ao colocado pela nossa posição, e também ao expressado pela própria pró-reitora ao início da reunião, quando abordou a discussão necessária a ser feita posteriormente à aprovação, o grupo de professores interessados em fazer “passar a boiada” manteve sua postura autoritária e arrogante, aprovando por fim sua proposta antes de termos resultados dos formulários ou um debate com a comunidade universitária.
Restam-nos algumas perguntas pertinentes: se nem uma pandemia, de uma doença que é ainda pouco conhecida, em meio ao caos econômico, social e político que vivemos, é capaz de sensibilizar e tentar trazer mais para perto da realidade de nós mortais esses seres superiores, o que será capaz? Imaginem o que já não têm planejado para implementar em seus programas e contra seus estudantes? Reiteramos aqui que a APG segue em luta contra o autoritarismo praticado por certos grupos de professores e está a disposição para eventuais episódios de abusos e assédio moral que venham a sofrer.
O parecer foi aprovado por votos de Rui Daniel Prediger (CCB), Leila Hayashi (CCA), Ricardo Moraes (CTS-Araranguá), Eduardo Luiz Gasnhar Moreira (CCB), Glauber Wagner (CCB), Ariane Zamoner Pacheco de Souza (CCB), Werner Kraus Jr. (CTC), Enzo Morosini Frazzon (CTC), Jonny Silva (CTC), Larissa Carli (CTE-Blumenau), Alexandre Siminski (Curitibanos), Kelly Samara Silva (CDS), Cíntia Soares (CTC), Orides Mezzaroba (CCJ), Marcelo Arend (CSE), Katia Lin (CCS), Patricia Faria Di Pietro (CCS), Elena Riet Correa Rivero (CCS), Roberto Pacheco (CTC), Ivan H. Bechtold (CFM) e Elenara Lemos Senna (CCS). No entanto, a luta segue. É importante que a categoria da pós-graduação, que é, em grande parte, contrária à medida, esteja cada vez mais organizada, seja junto à APG ou através das assembleias estudantis de cada programa, para que consiga acompanhar e questionar em cada Colegiado a adesão ao ensino remoto de tal forma atropelada – tarefa na qual podem contar com a APG UFSC.
Associação de Pós-Graduandos da UFSC
27 de maio de 2020
ERRATA: A primeira versão deste texto alegava equivocadamente que o professor Orides Mezzaroba é vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Direito (PPGD). O professor é vinculado ao Programa de Pós-Graduação Profissional em Direito (PPGPD).