Atualização 16/08/18: Solicitações que utilizaram o requerimento foram analisadas pelo Conselho de Curadores, momento em que defendemos a argumentação, mas infelizmente não foram bem-sucedidas. Não estamos mais recomendando aos ex-discentes que o utilizem no momento.
A APG-UFSC publica em seu site, na seção de Modelos dos Documentos públicos, um modelo de requerimento para expedição de diploma de Pós-Graduação sem multa, que todo pós-graduando pode utilizar, inserindo os dados de sua situação particular, para obter seu diploma mesmo se não tiver pago a multa referente ao atraso na entrega da dissertação/tese na Biblioteca Universitária (BU). O mesmo modelo pode ser usado, a critério do pós-graduando, para solicitar a extinção de sua multa.
A exigência de pagamento da multa para entrega dos diplomas, na UFSC, está atualmente suspensa. No entanto, a orientação da CAP/PROPG ainda é fazer um requerimento solicitando a expedição do diploma sem pagamento da multa. Caso a extinção da multa também seja solicitda, seu pagamento fica condicionado à futura decisão do Conselho de Curadores.
Reproduzimos aqui a justificativa constante no documento. Agradecemos o doutorando Rodrigo Alessandro Sartoti pela pesquisa que substancia o documento, e por permitir à APG-UFSC que o compartilhasse com a comunidade das/os pós-graduandas/os da UFSC.
Justificativa
A Resolução Normativa n. 95 (2017) do Conselho Universitário, em seu art. 65, traz a obrigação de depósito das teses e dissertações junto à Biblioteca Universitária, por parte das/os pós-graduandas/os, no prazo de 30 dias após a aprovação pela banca examinadora.
Por seu turno, a Resolução n. 18 (2017) do Conselho de Curadores da UFSC estipula valores de multa/dia para as/os pós-graduandas/os que atrasarem os respectivos depósitos junto à Biblioteca, sem, todavia, condicionar a entrega do diploma ao pagamento da multa.
Já a Lei 9.870/99, que dispõe sobre os valores das anuidades escolares, é enfática ao proibir expressamente a retenção de diplomas em virtude de inadimplência, conforme se extrai do art. 6º:
São proibidas a suspensão de provas escolares, a retenção de documentos escolares ou a aplicação de quaisquer outras penalidades pedagógicas por motivo de inadimplemento, sujeitando-se o contratante, no que couber, às sanções legais e administrativas, compatíveis com o Código de Defesa do Consumidor, e com os arts. 177 e 1.092 do Código Civil Brasileiro, caso a inadimplência perdure por mais de noventa dias.
Verifica-se perfeitamente que não há na legislação interna da UFSC quaisquer dispositivos que permitam a retenção de diploma em virtude de inadimplemento de multa. Ademais, a legislação federal veda expressamente tal retenção.
Inclusive, cabe mencionar que o Ministério Público Federal ingressou com a Ação Civil Pública n. 5013326-28.2017.4.04.7200 contra a UFSC, em trâmite perante a 4ª Vara Federal de Florianópolis/SC, requerendo que a Universidade se abstenha de condicionar a expedição de diplomas de pós-graduação ou quaisquer documentos universitários ao pagamento de débitos de multas ou outras pendências financeiras. A ação ainda não foi julgada, mas a UFSC informou no processo que não está mais condicionando a entrega dos diplomas de Pós-Graduação ao pagamento das multas por atraso no depósito junto à Biblioteca desde julho de 2016.
Para além da ilegalidade da retenção do diploma, temos que a cobrança de multa, por si só, também é ilegal.
A Constituição da República estabeleceu o acesso à educação como Direito Fundamental do indivíduo, acompanhando os preceitos do art. 26 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, subscrita pelo Brasil. Além disso, o art. 206, inciso IV assegura a gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais. Ao comentar este dispositivo da Constituição, o professor José Afonso da Silva assevera o âmbito da eficácia da norma:
A verdade é que, se a Constituição estabeleceu que a educação é direito de todos e dever do Estado, significa que a elevou à condição de serviço público a ser prestado pelo poder público indiscriminadamente e, portanto, gratuitamente aos usuários, ficando seu custeio por conta das arrecadações gerais do estado. Então, o Estado há de cobrar para cumprir seu dever? E o direito correlato tem que ser pago? (SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 842)
Desta forma, a cobrança de quaisquer valores vinculados às atividades acadêmicas em universidades públicas – as quais são subsidiadas pelo poder público –, tais como as multas impostas pelas Resoluções supracitadas, afrontam este princípio preconizado no texto constitucional. O dispositivo constitucional da gratuidade do ensino é bastante claro e direto, dispensando maiores digressões acerca do tema.
No presente caso, não há qualquer situação fática ou jurídica que justifique o afastamento da gratuidade do ensino em uma universidade federal para cobrança de multa em valor exorbitante, de modo que o valor em questão não pode ser cobrado em hipótese alguma.
E nem se diga que a multa é uma forma “eficaz” de sanção para compelir os/as pós-graduandos/as a procederam com seus respectivos depósitos de teses e dissertações.
Ora, é sabido que os cursos de mestrado e doutorado, com seus prazos exíguos e suas metas de produtividade, consomem tempo e energia dos estudantes, levando estes à quase total exaustão física e emocional. Inclusive, cabe ressaltar que a pressão dos cursos tem levado ao adoecimento de estudantes de pós-graduação, com desenvolvimento de sérios quadros clínicos de depressão e estresse. Assim, é plenamente compreensível que haja um atraso entre a defesa final com aprovação (requisito legal para obtenção do título) e o efetivo depósito do trabalho.
Neste sentido, não há necessidade alguma de fixar valores altíssimos de multas para forçar os pós-graduandos a procederem seus depósitos, vez que o simples fato de condicionar a entrega do diploma ao depósito do trabalho já é medida mais que suficiente. O pós-graduando que necessitar do diploma para gozar dos direitos inerentes ao seu título certamente procederá com o depósito do trabalho. É inimaginável que alguém faça um curso de pós-graduação, finalize-o, defenda trabalho final e obtenha aprovação para, após todo esse percurso, não querer ter em mãos o documento que viabilize a utilização do título.
Se a UFSC deseja ter a garantia de que as dissertações e teses serão depositadas na Biblioteca, basta editar normativa interna condicionando a entrega do diploma ao efetivo depósito do trabalho. Simples e sem a necessidade de violar a gratuidade do ensino prevista na Constituição.