No último dia 26 de abril, ocorreu o segundo turno da consulta informal para a reitoria da UFSC. A Comissão Eleitoral Representativa das Entidades da Universidade Federal de Santa Catarina (Comeleufsc) é formada por representantes da Associação dos Professores da Universidade Federal de Santa Catarina (Apufsc), do Sindicato de Trabalhadores em Educação das Instituições Públicas de Ensino Superior do Estado de Santa Catarina (Sintufsc), do Diretório Central dos Estudantes (DCE) e da Associação de Pós-Graduandos (APG)[1].
Desde 1983, a consulta é realizada de forma paritária na UFSC, ou seja, o peso dos votos de cada categoria (estudantes, professores e técnicos) é de 1/3 no resultado final. [2].A escolha do reitor acontece em duas partes. A primeira é a consulta à comunidade universitária, que é chamada de informal. A segunda é a votação no Conselho Universitário (CUn), para formação da lista tríplice que será enviada ao Presidente da República, para que este faça a escolha de um dos três nomes para ser nomeado reitor da universidade.
Historicamente, em outros mandatos presidenciais os reitores nomeados na universidades eram aqueles mais votados pela comunidade universitária. Porém, não há impedimento legal para que presidente escolha, entre três nomes indicados pelo CUn, aquele que preferir. Esse pretexto legal, entulho da ditatura militar, está sendo usado pelo presidente Jair Bolsonaro para realizar intervenções em universidades e institutos federais.
É nesse contexto problemático, que fere a autonomia universitária, que a UFSC atualmente enfrenta um novo desafio: finalizada a etapa de consulta informal à comunidade universitária a respeito dos(as) candidatos(as) à reitoria, iniciou-se o processo de inscrição das candidaturas no Conselho Universitário (CUn).
Historicamente, apenas se inscrevem no processo eleitoral do CUn pessoas de confiança da chapa eleita pela comunidade universitária durante a consulta informal, de maneira que a lista tríplice contenha apenas nomes que representem o projeto político escolhido foram legitimados pela comunidade universitária. Essa estratégia busca preservar a autonomia universitária e evitar que intervenções diretas ou indiretas ocorram por parte do governo federal. Contudo, o que ocorreu tem ocorrido na UFSC essa semana nos últimos dias, foi a inscrição no processo eleitoral do CUn por parte de um servidor docente que sequer concorreu ao pleito organizado para a consulta informal universitária.
Essa postura autoritária tem sido disfarçada com legalismos e imposições burocráticas que buscam deslegitimar a consulta democraticamente organizada pelas entidades representativas de estudantes, servidores técnico-administrativos e servidores docentes.
A APG, que construiu ativamente o processo de consulta informal à comunidade universitária, repudia essa postura, que desrespeita a tradição das eleições de reitoria no CUn, além de ser um ataque direto à já escassa autonomia universitária. Defendemos que seja respeitada a decisão tomada democraticamente pela comunidade da UFSC, contra qualquer tipo de intervenção na universidade!
O que os candidatos que não se submeteram à votação da comunidade universitária afirmam é que a consulta foi realizada de forma que descumpre a lei. Contudo, incontáveis medidas na cronologia do recente histórico universitário no Brasil, restringiram as liberdades comunicacionais e fortaleceram a política de controle e contenção da suposta “autonomia” universitária.
A disputa pela conquista da autonomia universitária no Brasil tem sido uma luta incessante, mas que, aparentemente, está longe de se efetivar em sua integralidade. Durante a ditadura militar (1964-1985), as universidades sofreram intervenções, seus reitores(as) e professores(as) foram cassados e a “autonomia universitária” aniquilada. Com a Constituição de 1988, uma autonomia limitada, com a eleição de reitores(as) por meio da lista tríplice para escolha do presidente ou governador, a situação começou a mudar, embora a escolha dos(as) dirigentes das universidades públicas tenha se mantido até hoje muito longe de ser algo realmente democrático[3].
Por isso, a questão da “lista tríplice” da reitoria passando pela vistoria presidencial aponta, de modo claro, que mais do que exigir o cumprimento legal das resoluções de homologação da eleição das Universidades, há que se questionar tais legislações em seus fundamentos: uma herança do “dia que durou 21 anos” é, na verdade, “21 anos que ainda persistem”. E as “intervenções” de caráter golpista, sob a gestão presidencial da extrema-direita, as escolhas de Bolsonaro e seus asseclas “interventores” mostram os limites desta forma de eleição: um oportunismo político e ideológico no sentido mais amplo dessa herança militar. Rompendo a tentativa de autonomia universitária (deliberativa), o governo federal atravessa, na prática, o modelo vigente e o “respeito” que estava sendo praticado nestas eleições, onde o mais votado era geralmente o escolhido. Só que agora de forma unilateral por meio de seus fantoches reacionários nas reitorias. É o que mostra a “candidatura” às pressas dos bolsonaristas em questão: com justificativas – se podemos dizê-las – para advogarem pela “democracia”. O vazio do discurso aponta para os problemas do modelo de eleição que temos: as escolhas a dedo do mandatário presidencial jogam todo processo democrático no lixo.
A nossa entidade manifesta seu total apoio à Mobilização em defesa da democracia e do resultado da consulta à comunidade da UFSC. Por isso, gostaríamos de reforçar a convocação à comunidade, feita pelo Diretório Central dos Estudantes (DCE) Luís Travassos, para participar da manifestação de amanhã (02/05), às 08h em frente à reitoria.
Vamos todas e todos acompanhar a sessão e fazer barulho para garantir que nenhuma tentativa golpista passe! Garantir a legitimidade da consulta informal é garantir a voz de nossa comunidade!
[1] Ver mais em: < https://noticias.ufsc.br/2022/04/segundo-turno-da-consulta-para-a-reitoria-ocorre-na-proxima-terca-dia-26/ >.
https://60anos.ufsc.br/decada-de-1980/
[2] Ver mais em: < https://pp.nexojornal.com.br/linha-do-tempo/2021/A-autonomia-universit%C3%A1ria-no-direito-brasileiro >.
[3] Ver mais em: < https://www.marxismo.org.br/autonomia-universitaria/ >.