Boletim da Associação dos Pós-Graduandos da UFSC – APG/UFSC – Nº 1
Debate decorrente da assembleia dos pós-graduandos do dia 10 de agosto de 2012
Universidade em debate: quando a crise expõe as debilidades na produção de conhecimento
A situação da universidade brasileira é consequência de uma política manipulatória. A universidade, que já enfrentava crises estruturais, hoje se depara com um cenário ainda mais crítico. Desde a aprovação forçada do REUNI em 2007, a expansão do ensino superior federal caminha para uma real desestruturação (e não reestruturação) acadêmica. Isso é resultado da diminuição dos recursos devido à expansão de vagas realizada nas IFES e do estreitamento da relação capital-conhecimento científico proporcionado por tal reestruturação. Concretamente, os direitos estudantis, a contratação de professores e técnicos, a infraestrutura de salas e laboratórios e os demais recursos de auxílio à participação em eventos foram sensivelmente reduzidos na totalidade das IFES do Brasil, em comparação relativa à quantidade de alunos que havia antes.
A greve de professores e técnicos é apenas uma das expressões desse descontentamento. O arrocho salarial verificado nos últimos 20 anos e a desestruturação no plano de carreiras cada vez mais pioram a situação dos trabalhadores. Além disso, o impulso inicial deste que é o maior movimento de greve dos últimos 10 anos se deu nas universidades e cursos mais novos, notáveis pela precarização de suas estruturas e por serem consideradas pelo governo como “centros de ensino”. Ou seja, esta é uma greve que reivindica melhor remuneração, direito a progressão, melhores condições de trabalho e de saúde no trabalho, já que é notável a intensificação e o produtivismo a que esses trabalhadores são submetidos.
Por tudo isso, esta é uma greve gigantesca, que mobiliza mais de 90% dos professores e técnicos no Brasil (57 das 59 IFES ainda estão em greve dos professores). Diante desse quadro, o governo, que se comprometeu com um acordo em 2011 na reestruturação da carreira e não o cumpriu, após a deflagração da greve levou mais de um mês para negociar com os professores, e dois meses com os técnicos. O pior: ofereceu aumentos percentuais diferenciados para as categorias, divididos em três anos(em que a última parcela seria paga pelo governo federal que estiver em 2015). Também conseguiu piorar o plano de carreira. Além disso, depois da não negociação com os professores e técnicos, o governo criminaliza e reprime o direito constitucional de greve desses trabalhadores. Torna-se evidente que a educação não é prioridade para este governo.
Na UFSC, a cada semana vemos mais adesões à greve dos técnicos, e a dos professores se torna cada vez mais forte. Como ficou evidente na última assembleia da seção sindical do ANDES, a categoria começa a se levantar diante de condições cada vez mais precárias e exigir seus direitos. Mesmo burocratizando os processos decisórios dos professores, as votações em urna para entrada e permanência na greve demonstram que há um descontentamento muito elevado mesmo em uma universidade como a UFSC, considerada por alguns um “centro de excelência” (essa diferenciação também é consequência do REUNI).
Este é o momento em que todos devem se perguntar: para que e para quem serve o conhecimento? Qual a porcentagem de conhecimento científico produzido na UFSC, e nas IFES em geral, está favorecendo somente interesses privados? Quanto desse conhecimento se orienta à resolução dos problemas sociais e é destinado aos setores populares e movimentos sociais? Qual a dimensão dos problemas relacionados às condições de trabalho dos técnicos e professores? Para nós, pós-graduandos, esse ambiente social representa o que nos constituirá como trabalhadores nas diversas áreas do conhecimento, e, sejamos futuros docentes ou profissionais específicos, não podemos deixar de nos preocupar e aprofundar criticamente a situação.
Condições para o adiamento do Semestre 2012/2
A reunião do Conselho Universitário do dia 7 de Agosto decidiu pelo adiamento do início do semestre letivo de 2012/2 para todos os cursos de pós-graduação. A APG declarou-se favorável a tal decisão, por motivos que vão desde a necessidade da eliminação da falsa dicotomia entre graduação e pós-graduação, que se baseia em uma concepção distorcida da distribuição das atividades de ensino, pesquisa e extensão dentro da Universidade, até a visão idílica e desatualizada de que a realidade sócio- econômica dos pós-graduandos difere da realidade dos alunos de graduação.
Mais da metade dos estudantes de pós-graduação não conta com bolsa, e tem que conciliar suas atividades de pós-graduação com algum trabalho a fim de sobreviver e permanecer na universidade. A situação dos bolsistas, embora um pouco melhor, não está sequer próxima do ideal. O valor das bolsas está defasado e se mostra insuficiente para garantir as necessidades básicas dos estudantes que dependem dela para sobreviver. Por tudo isso, a permanência de um percentual cada vez maior de estudantes de pós-graduação depende da pouca estrutura de direitos estudantis da Universidade, como biblioteca, auxílios financeiros para participação em eventos acadêmicos, e restaurante universitário.
Todos esses fatores prejudicam profundamente o desenvolvimento da pesquisa científica e a permanência dos estudantes na universidade. Com isso, várias atividades relacionadas a projetos de pesquisa, disciplinas cursadas, formação de bancas de qualificação e defesa, entre outras, são fortemente prejudicadas.
Esclarecemos que, ao contrário do que vem sendo afirmado em alguns lugares, as bolsas de mestrado e doutorado não podem ser afetadas por modificações no calendário dos cursos de pós-graduação acarretadas pela greve. Isso porque com o respeito ao “calendário de exceção” são mantidos os requisitos necessários à manutenção das bolsas. Os prazos inalteráveis até o momento são os de relatórios e defesas. Esse quadro pode ser modificado com a greve da CAPES e a possível adesão do CNPq, ou com a negociação do ANDES e ANDIFES com as agências. Ressaltamos também que os impactos da alteração no calendário dos cursos na avaliação dos mesmos pela CAPES são inferiores a 5%. Esse percentual é ínfimo diante do prejuízo à permanência estudantil e ao desenvolvimento com qualidade das atividades de ensino, pesquisa e extensão se fosse mantida a assincronia dos calendários e a regularidade de nosso semestre sem a estrutura necessária a ele.
O adiamento do semestre da pós-graduação não é apenas um ato de solidariedade com as greves do ensino público federal. As pautas de estudantes de graduação e pós-graduação, servidores e professores se intercomunicam, constituindo uma luta legítima, legal e politicamente, sendo o atendimento do conjunto de tais demandas essencial para a construção de uma universidade pública, gratuita, laica, de qualidade e a serviço dos interesses da maioria do povo brasileiro nos âmbitos inseparáveis do ensino, da pesquisa e da extensão.
Por fim, sublinhamos que o adiamento do início do semestre para a pós-graduação, constatada a necessidade do acesso a direitos como biblioteca e restaurante universitário, sendo momento crucial para a defesa da criação de uma política ampla de assistência estudantil que contemple os pós-graduandos. Inclusive é momento de revertermos a falácia de que esses estudantes não precisam de RU, e nem de bibliotecas (argumento recorrente entre “renomados intelectuais”). Dessa situação temos de partir para outros em que conquistemos, de fato, nossos direitos.
A luta pelo reajuste e isonomia das bolsas continua!
A reivindicação dos pós-graduandos por um reajuste que reparasse os índices inflacionários de todos os quatro anos sem a correção era de 40%, e o governo cedeu com uma medida paliativa de 10% para 2012 e um “possível” aumento em janeiro de 2013. Inicialmente, o governo silenciou-se e tratou de maneira paralela o módico reajuste das bolsas CAPES/REUNI de agosto. Mais tarde, após a pressão dos estudantes de pós-graduação e suas associações pela isonomia das bolsas, o reajuste das bolsas CAPES/REUNI foi oficializado e equiparado ao dado às bolsas CAPES e CNPq.
Apesar do projeto REUNI acabar neste ano de 2012, já existe a intenção de implantar-se uma segunda etapa do REUNI. Diante de um cenário incerto por parte do governo, defendemos o aumento do número de bolsas, de maneira que elas atendam à demanda dos programas.
Nossa principal reivindicação é que haja isonomia entre as bolsas voltadas ao desenvolvimento de pesquisas. A atuação dos estudantes que recebem bolsas de pós-graduação não deve ser voltada para a realização de atividades decorrentes da falta de contratação de docentes e técnico-administrativos. Queremos que as bolsas que já temos sejam mantidas, e que novas bolsas sejam criadas para atender à demanda cada vez maior. Entretanto, não aos moldes das “condicionalidades” do REUNI. Por isso, é urgente que nós, pós-graduandos, discutamos os impactos desse projeto durante os anos de sua vigência.
De acordo com o comunicado do governo, o próximo reajuste foi prometido para janeiro do ano de 2013. Desde já devemos intensificar a campanha e a mobilização para lutar pelos 40% de reajuste nas bolsas de pós-graduação, principalmente porque percebemos que não é uma qualidade notável desse governo cumprir promessas e acordos.
Pós-graduando, venha participar de sua associação! Visite nosso blog e conheça a pauta de reivindicações. e-mail: apgufsc@gmail.com