Carta aberta à reitoria da Universidade Federal de Santa Catarina sobre a Resolução Normativa que dispõe sobre o ensino remoto na pós
A resolução normativa que dispõe sobre a possibilidade de implementação do ensino remoto na pós-graduação será pautada no próximo Conselho Universitário, que ocorrerá amanhã (29/11). A reitoria escolheu pautar a resolução ignorando diversas manifestações contrárias de sua comunidade acadêmica sobre a Resolução.
No único espaço promovido pela Reitoria sobre a normativa (15/09), foram apresentadas muitas falas contrárias feitas por docentes, técnicos e estudantes, compreendendo que a resolução será um marco político-pedagógico, sendo tramitada em pleno momento de grandes cortes orçamentários na Universidade. Os questionamentos reforçam a necessidade de maiores discussões sobre a Normativa.
Por conta de seu teor político, é gritante a falta de embasamento científico para comprovar o aumento da qualidade do ensino, a implicar na ausência de uma avaliação sobre o ensino remoto emergencial e seu significado em nossa universidade. Além disso, faltam indícios de ampliação das políticas de permanência com a institucionalização desse ensino. Portanto, nos perguntamos: quais as consequências dadas pela Reitoria a partir dos questionamentos feitos pela comunidade?
Após os debates, críticas e contribuições da comunidade acadêmica a ÚNICA diferença proposta pela Reitoria foi a implementação de um oitavo artigo que visa “avaliar o ensino depois de um ano letivo com a vigência desta Resolução Normativa”, com base em um método que sequer foi definido. Avaliação do ensino após um ano de sua implementação? Reivindica-se que sejam apresentados critérios político-pedagógicos IMEDIATOS para a implementação das políticas antes de qualquer experiência. Estamos saindo neste exato momento de um período de dois anos de Ensino Remoto Emergencial. Onde está a avaliação desse período comprovando que o mesmo elevou a qualidade na educação de ensino superior, qualidade esta que deveria refletir-se na melhoria dos índices de ensino, pesquisa e extensão?
Um compromisso verdadeiramente democrático com a comunidade acadêmica não termina com a escuta de suas críticas e contribuições, mas se estende também no momento da formulação da política universitária. Na contramão disso, as críticas feitas nos debates sobre a Resolução foram completamente ignoradas.
Compreendendo a importância da matéria, nossa entidade realizou debates formativos sobre o tema, e voltados à comunidade acadêmica, com a participação de professores e pesquisadores da Educação; promovemos espaços de debate, a incluir rodas de conversas entre estudantes de pós-graduação e encontros com representantes discentes. Para além de uma posição da gestão Carcará, realizamos Assembleia dos estudantes de Pós-graduação no dia 20 de outubro, construída coletivamente pelos estudantes, a culminar na decisão de encaminhar a posição de rejeição unânime a qualquer proposta de implementação de ensino remoto!
A posição decidida legitimamente na Assembleia da pós foi ressaltada por nossas conselheiras representantes em sessão do CUn, que apresentou o panorama dos cortes orçamentários da universidade. Reiterou-se o pedido naquele momento de engavetamento dessa pauta, pois não diz respeito aos anseios dos estudantes de pós-graduação. O pedido de engavetamento da pauta foi uma decisão da assembleia, contra a qual a reitoria decidiu se opor.
Para nós, o projeto que está sendo apreciado pela administração central que a princípio parece ser só para a pós-graduação, está totalmente atrelado a projetos ligados às classes dominantes, como o Reuni Digital. Na raíz, o que diferencia verdadeiramente esses projetos? E o que impedirá que essa política não se espraie pela universidade?
O que a pós-graduação gostaria de estar discutindo na maior instância de deliberação da Universidade é o que fazer com essa crise orçamentária que afeta nossas pesquisas; como solucionar a falta de insumos e infraestrutura em nossos laboratórios; e como constituir uma formação sólida para os pesquisadores da UFSC. Onde estão os debates de pautas urgentes para estudantes da pós-graduação, como, por exemplo, o reajuste do valor da bolsa para quem está na pós-graduação e a ampliação delas? A ampliação das políticas de permanência universitária para a garantia do acesso à pós-graduação por toda a sua comunidade, a qual inclui a população negra, indígenas e quilombolas, de baixa renda, mães, pessoas com deficiências, que entre tantos, são os primeiros a ser expulsos da universidade? Em que medida contribuirá para uma maior qualidade de vida e sociedade mais justa quando não teremos parte dos estudantes em nossas salas de aula? Como garantir que essas “vagas remotas” não são o primeiro passo para a cobrança de mensalidade na pós-graduação?
A lista é interminável. Entretanto, infelizmente, a reitoria ESCOLHE seguir colocando nossos pesquisadores em posição de subserviência aos interesses dominantes, interesses esses alheios à vontade daqueles que vivem o dia a dia da pesquisa no seio da universidade.
Viemos por meio desta carta cobrar mais uma vez da Reitoria que a decisão dos estudantes da pós-graduação seja respeitada e que a pauta seja engavetada! Esta é uma política que para a classe estudantil é sentida como traição, porque desrespeita a vontade coletiva da comunidade acadêmica apoiadora desta gestão. Ou a reitoria se esquece, agora que está sentada na principal cadeira da universidade, que foram muitos de nós quem te colocaram aí? A APG ressalta que o poder democrático que elegeu a atual reitoria também é o poder democrático que explicita e legitimamente rejeita qualquer modalidade de ensino remoto!
Não se trata de decisão técnica, mas de consenso político daqueles que produzem pesquisas para o país – cabendo, portanto, da parte da reitoria, que use dos recursos que possui para que a normativa do ensino remoto não seja instituída na UFSC e respeite a decisão estudantil. Que não se repita o caso da EBSERH em nossa universidade.
Florianópolis, 28 de novembro de 2022
Associação de Pós-graduandas e pós-graduandos (APG) – Gestão Carcará