Uma proposta de Tecnologias da Informação livres para as universidades públicas

15/09/2020 14:22

Enquanto a UFSC firma parcerias com corporações como a Google e a Microsoft sem debate com a comunidade universitária, seguimos o início das atividades de ensino remotas sem uma proposta alternativa de que tecnologias e que infraestrutura precisamos para nossa universidade.

No mês de julho, um conjunto de professoras(es) e pesquisadoras(es) de todo o país formularam o esboço de uma alternativa, apresentada ao conjunto das universidades e institutos públicos do país. Trata-se da “Proposta de política de tecnologias da informação para as Instituições Públicas de Ensino Superior brasileiras na condição pandêmica da COVID-19 e para além dela“.

O grupo, vinculado à pesquisa Educação Vigiada, que coletou informações sobre o grau de dependência de nossas instituições educacionais às plataformas privadas, apresenta diversas preocupações com essas parcerias. Entre elas, estão “desvalorização da formação dos sujeitos, privatização da educação pública e fortalecimento dos valores do capital na educação”. Além disso, chamam atenção para “os riscos da entrega dos dados escolares, funcionais e científicos (implicando alunos, professores, servidores e famílias) das escolas, institutos e universidades à essas empresas”, que irá ampliar os “mecanismos de controle e vigilância sobre uma parcela significativa da população”.

Em seu documento, defendem a construção e ampliação de infraestrutura de tecnologia da informação com princípios como o acesso livre, códigos abertos e auditáveis, além de servidores próprios e públicos atuando em regime federado. Sua proposta trata em mais detalhes ferramentas como emails, compartilhamento de arquivos, edição de textos, hospedagem de vídeos, vídeo-chamadas, entre outros elementos.

Sabemos que, na universidade, temos milhares de pessoas com conhecimento, interesse e capacidade para pensar nessas alternativas. Enquanto comunidade universitária, na verdade, é nossa responsabilidade pensar e propor essas alternativas. Por isso, reforçamos o chamado desse grupo de pesquisadoras(es) por uma outra política para nossas Tecnologias da Informação, muito diferente daquela sendo implementada hoje na UFSC e na maioria de nossas universidades. É nosso papel construir uma tecnologia e uma educação para além do capital!

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A FAPESC precisa de uma direção comprometida com a ciência e tecnologia públicas!

17/07/2018 11:00

No dia 20/06/18, ocorreu a Audiência Pública “Ciência, Tecnologia e Inovação como política de estado em Santa Catarina” no Plenarinho da Assembleia Legislativa de Santa Catarina (ALESC). A audiência, convocada pela seccional catarinense da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), contou com a presença de autoridades e representantes de entidades dos níveis estadual e nacional e se propôs a discutir, as políticas catarinenses para Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I).

A Associação de Pós-Graduandos da UFSC esteve presente e realizou uma fala que pode ser assistida aqui (parte dela foi a leitura de nossa nota previamente publicada, que pode ser lida aqui). Dentre as demais falas, contudo, damos particular destaque ao discurso do presidente da FAPESC, Sergio Luiz Gargioni, que muito nos preocupa por enfatizar apenas questões de mercado e financiamento de empresas, deixando de lado a pesquisa básica, as ciências humanas, a educação, as bolsas e a demanda por uma produção científica e tecnológica a serviço das necessidades da maioria do povo.

Entendemos enquanto legítima a reivindicação pelo cumprimento do Artigo 193 da Constituição do Estado de Santa Catarina, que determina a destinação de pelo menos 2% das receitas do estado à pesquisa científica e tecnológica. Entretanto, o mesmo artigo prevê a destinação de metade desta receita à pesquisa agropecuária, o que se reflete na prática em financiamento para a Epagri (Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina). Com relação à outra metade, não existe garantia de distribuição mais equânime entre as demais áreas na produção científica e tecnológica do estado catarinense, o que a deixa à mercê do Estado e órgãos como a FAPESC, que recebe boa parte do montante destinado a CT&I.

Por isso a fala de Sergio Gargioni é tão lamentável. Chamado para falar sobre o financiamento público da ciência catarinense, o presidente da FAPESC falou durante 20 minutos sobre empreendedorismo, startups e parcerias com investidores internacionais. Defendeu um modelo no qual não se veja nenhuma diferença entre quem é cientista e quem é empresário, onde o dinheiro da FAPESC deveria servir para financiar novos empresários – com o dobro de dinheiro se eles falirem uma vez, com o triplo de dinheiro se eles falirem novamente. A preocupação da Audiência Pública era o corte de verbas para as Universidades e para as bolsas de pesquisa que afetam todas e todos os pesquisadores, mas Gargioni não mencionou nenhuma vez as ciências humanas, sociais, artísticas, nem mesmo as ciências naturais que fazem pesquisa de base – mas exclusivamente a ciência capaz de gerar empreendimentos privados.

Caso consigamos que a lei seja cumprida no estado (o que parece ser pedir demais em Santa Catarina, visto que os deputados estaduais nunca a seguiram) e 1% do orçamento estadual seja dirigido para a FAPESC, o que concretamente ganhamos? Ao que tudo indica, uma política de repasse direto dos recursos públicos para agentes privados, que vão aplicá-los (às vezes em parcerias com agentes privados internacionais) em tecnologias para ampliar suas margens de lucro. O horizonte de financiamento sucessivo de projetos fracassados revela com incrível honestidade a verdadeira opinião do empresariado – e seus defensores nas instituições públicas – quanto ao suposto ideal de “meritocracia”. Para fins de comparação, o mais recente edital de bolsas de mestrado e doutorado da FAPESC indica que “em caso de insuficiência de desempenho do bolsista” (embora sem qualquer critério que defina tal insuficiência), a bolsa poderá ser cancelada imediatamente; no entanto, se fôssemos aplicar o mesmo critério que Gargioni visualiza para seus colegas empreendedores, o pós-graduando deveria, pelo contrário, receber o dobro do valor da bolsa – quiçá o triplo!

Assim, consideramos que não há horizonte possível de financiamento público da ciência em Santa Catarina enquanto a direção da FAPESC estiver defendendo uma política de redistribuição regressiva de renda – do fundo público diretamente para as mãos da burguesia industrial do estado. Para impulsionar e aprimorar a ciência catarinense, é preciso muito mais que quantidade de recursos – é necessário debater profundamente o que se entende por ciência, por seu papel em uma sociedade profundamente desigual, e melhorar qualitativamente a distribuição de recursos segundo essa concepção revigorada daquilo que a ciência pode fazer pelo povo catarinense.

Conclamamos assim a todas e todos que estão comprometidos com o avanço da ciência catarinense, mas também com seu direcionamento para a satisfação de demandas populares e da construção de uma ciência que também seja diversa e com pesquisa de base, a pressionar o estado catarinense e a FAPESC por mudanças substantivas na maneira como os “negócios” têm sido conduzidos nesse domínio de atividade. O financiamento público de ciência e tecnologia é também para a ciência de base, para as ciências humanas, sociais, educação, arte e cultura – e precisa ser investido nas instituições públicas, com participação e controle popular!

Recortamos aqui o vídeo com a fala completa de Gargioni, para que possa ser avaliada por bolsistas, acadêmicos, coordenadores de pós-graduação, entidades acadêmicas e demais pessoas preocupadas com o financiamento da ciência pública no estado.

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